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Maioridade penal

Cada vez que acontece um crime cruel e hediondo envolvendo menores de idade multiplicam-se as bocas que gritam para a redução da idade penal. É obvio que este grito é orquestrado e reforçado por todo um sistema de comunicação, que parece agradar a grande parcela de leitores, ouvintes e telespectadores. Pela repetição de fatos parecidos, expondo nas reportagens o maior grau de crueldade possível, cria-se a ideia que os piores criminosos do país são adolescentes e jovens. Não há nenhum número oficial que possa sustentar esta tese. Diante de um clima generalizado de insegurança, violência e impunidade, abre-se um canal para descarregar toda uma reserva acumulada de impotência, frustração e raiva.

Não queremos aqui banalizar a crueldade, nem defender a impunidade. Também não somos indiferentes à grande dor das vítimas. Podemos compreender a aflição, a indignação e até os sentimentos de vingança dos familiares e amigos. Para quem perde um filho ou filha em assaltos e assassinatos o sofrimento é muito profundo e deixa marcas para toda a vida. Não há como reparar estas perdas.

Outra coisa é, aproveitar-se destes sentimentos para culpabilizar sem distinção os jovens envolvidos. Alguns programas “policiais” de TV acompanham a perseguição aos delinqüentes ao vivo, quase colocando para os telespectadores a possibilidade de fazer justiça com as próprias mãos. O sensacionalismo dos meios de comunicação parece criar a ilusão de que a justiça seja feita. Ao analisar bem a reação de muitas pessoas parece que não se trata tanto de justiça, mas sim de vingança.

Os treinadores de clubes de futebol que nos digam o quanto ficam preocupados em expor jovens talentos em um clube que passa por dificuldades. Eles sabem que expondo cedo demais estes jogadores às vaias e ao linchamento público, isso pode prejudicar demais sua futura vida profissional. Mas quando se trata de jovens infratores, muitos pensam que devem ser tratados (diga-se punidos) como gente grande.

Argumenta-se que adolescentes a partir de 16 anos tem direito a voto e por isso mesmo podem ser considerados aptos a responder por seus atos. A realidade por trás deste raciocínio esconde muitas outras motivações. A insistência na redução da idade penal de certa forma revela a incapacidade e a má vontade de lidar com os verdadeiros problemas da criminalidade, da violência e das questões ligadas à desigualdade social. De fato, como explicar esta carga emocional tão pesada quando se trata do envolvimento de adolescentes em atos de violência? Se os números oficiais que tratam de tais atos infracionais não chegam nem a 2%? E porque não se dá quase nenhuma ênfase à violência onde o mesmo público juvenil é vítima? Quantos adolescentes e jovens são assassinados a cada fim de semana, especialmente nas periferias das grandes cidades? Destes, realmente, se faz pouco caso. Nem aparecem nos programas televisivos e ocupam pouco espaço nas páginas policiais dos jornais. A indignação midiática e popular é pouca. Servem somente para aumentar o número das estatísticas e em alguns casos nem constam entre os dados oficiais. Estas considerações já nos levam a perceber que precisamos ir além dos sentimentos e das emoções para tratar da questão da maioridade penal. 

Ultrapassando as emoções e olhando com mais objetividade a questão de pessoas envolvidas em atos de violência antes de completar 18 anos, temos que procurar entender as causas para não apresentarmos soluções imediatistas. Toda esta discussão está focada nos efeitos e não nas causas da violência. Isso é óbvio e de fácil entendimento quando fazemos uma comparação com o mundo da medicina. Para curar uma doença é necessário dar o remédio certo e para tanto há necessidade de uma análise das causas. Se não diagnosticar bem se pode dar um remédio para dor de cabeça que provocará sérios problemas e até a morte do paciente. Fundamentalmente devemos nos perguntar como e porque estes jovens estão se envolvendo no mundo do crime. As respostas a estas perguntas vão nos permitir prevenir antes que o mal chegue a se expandir mais ainda.

Os defensores da redução da idade penal até 16 anos colocam em resumo os seguintes argumentos: os infratores são capazes de assumir a responsabilidade por seus crimes, assim vai se reduzir a violência e vai se acabar com a sensação de impunidade. 

Antes de tudo é interessante observar que mesmo entre defensores da redução da idade penal muitos concordam que isso por si só não é suficiente, ao mesmo tempo deve-se investir em medidas para reduzir a desigualdade social, corrigir as falhas na educação familiar e escolar além de promover programas sócio-educativos e rever o sistema penitencial. Todos sabem da superlotação das prisões e que o sistema carcerário atual não promove a reinserção social dos indivíduos. Há, portanto, muito a duvidar que este quadro realmente seja transformado com a redução da idade penal já que durante tantos anos nada foi feito frente às condições desumanas das cadeias brasileiras e que comprovadamente este modelo de sistema é incapaz de recuperar alguém.

Muitos argumentam que hoje os jovens de 16 anos já têm direito a voto e sabem muito bem distinguir entre o bem e o mal. Se são autorizados a votar também devem assumir a responsabilidade pelos crimes que cometem. A este respeito seria interessante analisar até entre adultos o grau de consciência que tem na hora de votar. É óbvio também que votar é uma coisa e ter comportamentos adequados de cidadania é outra. Já vi quadros comparativos onde se demonstra que em vários países da Europa e dos Estados Unidos até menores de 12 anos são responsabilizados por atos criminosos. Esta comparação, contudo, é muito inapropriada porque não leva em conta todo o processo escolar e educativo do qual gozam a grande maioria das crianças e adolescentes nestes países. Todo o ambiente social em que vivem é bem diferente. 

Ao nosso entender a redução da maioridade penal não é o remédio certo para acabar com a violência e a impunidade isso não somente por causa da baixa porcentagem de adolescentes envolvidos em crimes hediondos, mas por uma série de motivos, entre eles o fato que atrás dos crimes envolvendo adolescentes está toda uma rede de criminalidade de adultos. Se existe a necessidade de combater o crime, a violência e a impunidade – e todos concordam nisso – é necessário chegar primeiro aos grandes. A impotência para chegar aos verdadeiros criminosos não deve levar a desviar a atenção para o tema da redução da maioridade penal. Não precisa buscar aplicar aos adolescentes e jovens para recompensar o que não se consegue com os adultos.

Se há necessidade de punir – e mesmo o Estatuto da Criança e do Adolescente prevê isso – há maior urgência de investir em políticas públicas que criem condições melhores de vida. Para afastar crianças e adolescentes do uso de drogas e da prática de atos violentos, a maior preocupação não deve ser reduzir a maioridade penal, precisa-se responsabilizar os adultos que deixam suas crianças no abandono das ruas, os bandidos que as aliciam com ganhos fáceis nas suas quadrilhas criminosas – seria até mais eficiente punir com maior rigor adultos que envolvem jovens em crimes bárbaros – e os governantes que se omitem na execução dos seus deveres para com as crianças e adolescentes, especialmente no que diz respeito à educação de qualidade.

 

Texto de Padre Miguel Ramon

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